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Da porteira para fora (144) – Jornal Tribuna Liberal de 01/03/2020 – Perdão!

Existem diversas maneiras do “perdão” se manifestar ou ser inserido na nossa vida cotidiana, na maioria das vezes nosso interlocutor irá nos perdoar, no entanto, há uma, uma, uma com certeza que não receberemos o “perdão”.

Num exemplo de “perdão”, Dostoiévski em Os Irmãos Karamazov escreveu:” dirigiu-se ao Presbítero (e disse). – “Perdão”, reverendo Padre; sou um homem sem cultura e não sei em que termos me devo dirigir a vós…”

Deus é misericordioso e confiamos no seu “perdão” em O Alcorão 199. “Descei, também, de onde descem os demais, e implorai “perdão” de Deus, porque é Indulgente, Misericordiosíssimo.” Em 110. “E quem cometer uma má ação ou se condenar e, em seguida (arrependido), implorar o “perdão” de Deus, sem dúvida achá-lo-á Indulgente, Misericordiosíssimo.” Portanto, em vários trechos desse livro sagrado o “perdão” pode ser obtido, mas há uma situação que não conseguimos obtê-lo.

Concluímos que pedir o “perdão” trata-se de algo inteligente, Dostoiévski em O Idiota escreveu: “Não via nenhuma desonra em aceitar esse dinheiro, quando ia passar a fazer parte da família do marido. Mas se assim não era, não tinha a intenção de pedir “perdão” a quem quer que fosse e desejava que ficassem sabendo bem.”

O Papa Francisco em A alegria de Ser Discípulo escreveu: “Em suma, somos chamados a demonstrar misericórdia, porque a misericórdia foi, primeiramente, demonstrada a nós. O “perdão” das ofensas se torna a mais clara expressão do amor misericordioso, e para nós, cristãos, é imperativo do qual não podemos nos escusar.”

Neste documento do Papa Francisco há algo que não concordo quando ele diz: “Não posso dizer: Eu perdoo meus pecados. O perdão é pedido, é solicitado a outro, e na confissão pedimos perdão a Jesus. O perdão não é fruto de nossos próprios esforços, é uma dádiva, uma dádiva do Espírito Santo, que nos preenche com fonte …” devo dizer que quando aprendi criteriosamente a me perdoar, minha vida ficou mais leve.

O perdão deve ser pronunciado do fundo da alma, o nosso Guimarães Rosa nos ensina em Grande Sertão Veredas: “E Maria Mutema, sozinha em pé, torta magra de preto, deu um gemido de lágrimas e exclamação, berro de corpo que faca estraçalha. Pediu “perdão”. “Perdão” forte, “perdão” de fogo, que da dura bondade de Deus baixasse nela, em dores de urgência, antes de qualquer hora de nossa morte. E rompeu fala, por entre prantos, ali mesmo, a fim de “perdão” de todos também, se confessava.”

Muitas vezes penso que viver em países em guerras e corruptos já seria uma penitência muito maior que nossos mesquinhos pecados. Michel Foucault em Vigiar e Punir escreveu: ““O jogo eterno já começou: o suplício antecipa as penas do Além; mostra o que são; é o teatro do Inferno; os gritos do condenado, a sua revolta, as suas blasfêmias significam já o seu destino irremediável. No entanto, as dores deste mundo podem valer também como penitência para aliviar os castigos do Além: tal martírio, se suportado com resignação, não deixará de ser levado em consideração por Deus. A crueldade da punição terrestre inscreve-se como dedução da pena futura: desenha-se aí a promessa do “perdão”. Mas poderá ainda dizer-se: esses sofrimentos tão vivos não serão o sinal de que Deus abandonou o culpado às mãos dos homens? E, longe de garantirem uma absolvição futura, representam a condenação iminente; por outro lado, se o condenado morrer depressa, sem agonia prolongada, não será a prova de que Deus quis protegê-lo e impedir que caísse no desespero?”

 

A Bíblia em Marcos 3 28 “Em verdade vos digo que tudo será perdoado aos filhos dos homens: os pecados e as blasfêmias que proferirem.” 29 “Mas aquele que blasfemar contra o Espírito Santo não tem “perdão” para sempre, visto que é réu de pecado eterno.” 30 “Isto, porque diziam: Está possesso de um espírito imundo.” Então, fica a dica, custa pouco evitar blasfemar contra o Espírito Santo, ou seja, mesmo aqueles que não acreditam no Espírito Santo vale a reflexão: “Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay.”

Iniciamos o tema “perdão” deixando claro que há um ente que não nos perdoa, esse ente é sem dúvida o mercado. Sem nos planejarmos e uma boa estratégia o mercado não irá nos perdoar. Observemos que estamos em 2020, algum leitor mais atento poderia citar a biografia de Chatô de Fernando Moraes quando ele escreve: “O único problema é que, pouco ou muito, Chateaubriand não tinha esse dinheiro. Nem esse nem qualquer outro. Ou, ainda: Chateaubriand nunca tinha dinheiro algum. Tinha prestígio, tinha “alavancas”, começava a ter poder, mas dinheiro, que era bom, nada. Quem tinha dinheiro eram os banqueiros, os industriais, os comerciantes, os usineiros de açúcar do Nordeste e os cafeicultores de São Paulo. Mas sobretudo os banqueiros. Os agricultores viviam se lamentando porque chovia demais ou porque chovia de menos — mas, chovesse ou fizesse sol, ele nunca vira um banqueiro chorar miséria. Nem mesmo dos mineiros, famosos pela avareza, Chateaubriand podia se queixar. Ao contrário, costumava dizer que Minas Gerais era o seu “Vaticano do crédito”: lá o dinheiro era sempre pródigo, e, quando a vida o compelia ao pecado mortal do atraso no pagamento de uma letra, o “perdão” acabava vindo.”

 

Hoje, 2020, alguém aí do outro lado acredita que bancos irão perdoar nossas dívidas e erros mercadológicos como fizeram com o Chatô? Acredito que nem com a intercessão do Espírito Santo esse “perdão” financeiro virá. Aliás o próprio Espírito Sato ao ser questionado poderá citar DAI A CÉSAR O QUE É DE CÉSAR E A DEUS O QUE É DE DEUS Mc 12,13-17.

 

De qualquer maneira antes de pedir perdão ao mercado sugerimos construir um plano estratégico com o tripé; recursos, gente e uma boa ideia para que ele não nos excomungue. Uma boa consultoria também pode fazer a diferença num mundo V.U.C.A. (do inglês volatility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity ; em português: volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade, respectivamente).

(leia a matéria anterior)

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