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Da porteira para fora (155) – Jornal Tribuna Liberal de 10/05/2020 – FIB.

Minha avó nasceu em 1901, Joana Cherubim, quando ela completou 46 anos de idade inventaram um tal de PIB – Produto Interno Bruto, ela faleceu no ano 2000 e acredito sem saber o que significava PIB, embora, tenha tido uma vida digna e repleta de muitas alegrias.

Se o Brasil diminuir o PIB em 7% em 2020 será catastrófico dizem os economistas e pergunto: E se o Brasil aumentar o PIB em 7% como terá sido a vida dessa “ninguenzada” de dezenas de milhões de brasileiros que acaba de receber o CPF e R$ 600,00 (seiscentos reais)? Será que a vida deles teria melhoras significativas com um PIB chinês no Brasil? Não acredito! O fato de um país ser rico, não implica concluir que seu povo é rico e muito menos feliz!

Minha avó seguiu a vida dela, arrastando o português com sotaque italiano e na década de 60, quando ela já era uma pessoa idosa os americanos do Norte descobriram que o PIB não refletia exatamente o “status quo” da população e iniciaram a criação de diversos índices para medir essas condições extremamente variáveis de pessoa para pessoa.

Num exemplo, suponhamos a inflação, ela não reflete os efeitos de maneira idêntica entre as famílias, o aumento forte de um vinho italiano Barolo Falletto não é sentido por uma família vulnerável, enquanto, se o aumento importante se der no quilo de açúcar, essa família vulnerável sentirá na veia.

Os índices nos anos 60 pipocaram aos borbotões e, em 1972 surge no Butão o FIB – a Felicidade Interna Bruta, nesta data, minha avó que não tinha tido contato com o PIB, o FIB estava tão distante que quando ela veio a falecer no 2000, o FIB não a tinha atingido – embora – soubesse muito bem o que era felicidade e soube aproveitar as coisas simples que a vida lhe ofereceu a um preço que todos podem pagar.

Estamos em 2020 ainda guiados pelo PIB, alguns índices sociais ora acompanhamos ora esquecemos quando nos é conveniente. O cerne da questão é: O que queremos? Com certeza a maioria das respostas cairão em: Ser Feliz. Mas, Ser Feliz é diretamente proporcional a quantidade de dinheiro que temos no bolso? Não. Todavia, se não temos nenhum dinheiro, podemos afirmar que somos infelizes. Então, há uma quantidade de recursos mínimos e uma quantidade de recursos máximos onde a felicidade poderá navegar sem grandes tropeços.

Se nós mirarmos o Jeff Bezos com uma fortuna estimada acima de 100 bilhões de dólares será difícil afirmar que para aproveitar todo esse dinheiro ele almoce duas vezes ao dia. É difícil até afirmar que esse cara é ou não feliz, acabou de se separar da mulher e todos sabem o quão traumático é esse episódio.

O FIB é algo que minha avó já conhecia antes do PIB, muito provavelmente ela não conseguiria colocá-lo no papel, mas sim no coração. O FIB mede:

  1. o padrão de vida,
  2. o nível de educação,
  3. a saúde,
  4. a governança,
  5. o nível cultural,
  6. a vitalidade comunitária (exclusão da pobreza, exclusão da insegurança, exclusão da falta de instrução),
  7. a resiliência ecológica,
  8. o uso equilibrado do tempo e,
  9. o bem-estar psicológico.

Ou seja, é muito mais que um índice, mede através de questionários – que vem sendo aprimorados nas últimas décadas – um “jeitão” de se viver e ser mais feliz. Obviamente que quando damos um certo peso ao padrão de vida essa variável estará conectada diretamente com a economia. Agora, suponha que você compre uma Ferrari 250 GTO cujo valor deve estar por volta de 60 milhões de dólares, existem 39 exemplares deste modelo no mundo, a pergunta é: Onde você iria passear com essa Ferrari? Nas ruas de São Paulo, respeitando o rodízio é claro? Então, deveria haver um limite para os ganhos, não faz sentido uns jogadores de futebol ganharem milhões “por dia” aguardando em suas mansões o sinal verde para saírem a campo, enquanto, enfermeiras e médicos morrem nos hospitais já que a vacina não chega. Não faz sentido funcionários públicos no Brasil terem ganhos “n” vezes superior aos funcionários privados. Não faz sentido rendas diferenciadas serem tratadas igualmente com impostos idênticos. Não faz sentido as grandes fortunas não serem taxadas. Não faz sentido deixar do mesmo lado rentista e produtores.

O mundo atual está repleto de índices, sejam econômicos ou sociais, os econômicos na sua grande maioria estão conectados ao PIB e seus filhotes, como por exemplo, o PNL – Produto Nacional Líquido e os sociais como o IDH – índice de Desenvolvimento Humano ou mesmo o ILH – índice de Liberdade Humana, e por aí segue uma lista infindável. Será que precisamos de tantos índices? Nenhuma informação é igual a milhões de informações, ambos os cenários nos tornam um perfeito ignorante.

Nos anos 60 os índices sociais nascidos na América do Norte não atingiram minha avó, o motivo foi simples, iniciamos um período de 20 anos comandados por militares e no que pese as suas boas intenções (ninguém morreu rico), o lema vinha do comtismo “ordem e progresso” –  doutrina do francês Auguste Comte (1798/1857).

Após o término da era militar em 1985, já com mais de 80 anos minha avó seguia firme sem se conectar com o PIB, embora, alguns governos militares tivessem atingido a impressionante marca de crescimento do PIB de 8,5% num único ano, ela nunca ficou sabendo disso. Uma coisa acredito que intrinsicamente ela sabia, com seis filhos vivos à época, o PIB não media o bem-estar de sua prole.

É conveniente que o PIB não seja negativo, se for demonstra uma queda na produção e serviços, por outro lado, qual o PIB ideal? Como um país poderá crescer indefinidamente dentro de um planeta cujos recursos são exauríveis? Não é possível objetivar um crescimento de 5% ao ano “Ad Eternum” e entender que a “nave” nada irá sofrer!

Quando minha avó passou dos 90 anos, um recorde para essa geração, criaram o IDH – Índice de Desenvolvimento Humano. Vocês hão de concordar comigo, não carecia tentar explicar para ela essa nova sigla e, para ser sincero o interesse dela por sorvetes era infinitamente maior. Em 1992 criaram o ILP – índice de Liberdade Política, eu até me senti tentado a informá-la, mas fiquei receoso dela perguntar: E o Getúlio, Morreu?

Já próximo dela deixar essa nave em 1995 a PNUD lançou o Índice de Desenvolvimento Ajustado ao Sexo (IDS), o índice visava medir as diferenças entre homens e mulheres. Minha avó não ia à igreja usando calças, entendia ser aquilo um absurdo, o padre nunca iria perdoá-la. Então, como explicar para ela esse tal de IDS (Gender Empowerment Measure – GEM), um índice dedicado às mulheres e homens quando as tribos são as mais diversas, seria ainda mais complicado explicar esses “novos” conceitos. Em 2006 o Fórum Econômico Mundial lançou o GGI – Global Gender Gap Index medindo as diferenças entre sexos em quatro variáveis, participação econômica, educação, saúde e participação política.

Antes de conhecer essas novidades em 2000 minha avó partiu, foi melhor assim. O Gonzaguinha que nos deixou antes da minha avó em 1991, escreveu: “A gente quer viver felicidade”. Certo estava minha avó que deixou essa nave sem conhecer o PIB e sabia “A necessidade é que faz o sapo pular”.

Estamos em época de mudanças e esperamos que para melhor, então, por que as empresas e os países não adotam o FIB e, vamos em busca numérica da tal da felicidade?

(leia a matéria anterior)

 

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Dr Zero Cost

Dr Zero Cost por Ailton Vendramini, perfil realizador com formação na área de Engenharia, tendo trabalhado no Brasil e no exterior. Atualmente acionista em algumas empresas e foco em Mentoria & Consultoria para pequenas e médias empresas no segmento de Gestão/Vendas/Marketing/Estratégia.

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